terça-feira, 15 de junho de 2010

CERVEJA.

No antigo prédio do Cassino Atlantico (foto) funcionou a lendária TV RIO, num tempo em que Copacabana era um lugar adoravel.

POR ABSOLUTA FALTA DO QUE FAZER, FIQUEI ONTEM, ENQUANTO BEBIA UMA CERVEJA VENDO UM JOGO BOBO DA COPA DO MUNDO, ME PERGUNTANDO EM QUE ÉPOCA DA MINHA VIDA DESCOBRI A CERVEJA. NÃO ENCONTREI, DE PRIMEIRA, UMA RESPOSTA CONVINCENTE. TERIA SIDO AOS DEZOITO ANOS, QUANDO IA À GALERIA DEZON EM COPACABANA, ONDE SE CONVERSAVA A RESPEITO DE TUDO, SE CONHECIA GENTE INTERESSANTE E SE BEBIA TAMBÉM CERVEJA? SIM, NA DEZON EU JÁ BEBIA CERVEJA, MAS AINDA NÃO A "DESCOBRIRA". NOS ANOS SESSENTA, QUALQUER BEBIDA PARA MIM TINHA PAPEL SECUNDÁRIO. EU PODIA FICAR HORAS E HORAS CONVERSANDO, SEM NEM LEMBRAR DE TEMPERAR O PAPO COM UM DRINK FORTE OU FRACO. BEBIA, MAS A BEBIDA TINHA AINDA PARA MIM UM CARATER MERAMENTE ACESSÓRIO. NA DEZON CONHECI GENTE COMO ENEIDA, LÚCIO CARDOSO, FLÁVIO DE CARVALHO, CLARICE LISPECTOR ("até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso; nunca se sabe qual o defeito que sustenta o nosso edifício inteiro"), JOSÉ NOLASCO, ANTONIO BANDEIRA, HÉLIO OITICICA, MANECO MÜLLER, ALBERTO CAVALCANTE, FLORINDA BULCÃO (hoje Bolkan), CACILDA BECKER, WALMOR CHAGAS, LUISA BARRETO LEITE, ROBERT HIRSH, MARIA FERNANDA, EVTUCHENKO E MAIS DEZENAS DE PESSOAS EXCLUSIVAS. EXCEÇÃO FEITA À CLARICE, TODOS BEBIAM MUITO. ERA O TEMPO DOS GRANDES E GENIAIS PORRES. EU POREM, SÓ BEBIA PARA ME ENTURMAR, POIS NÃO GOSTAVA NEM UM POUCO DE ALCOOL. LEMBRO, CONTUDO, DE QUE BEBÍAMOS WHISKY, VODKA, CAMPARI, VINHOS E UMA COISA REPUGNANTE E ADOCICADA, DE QUE NÃO ME LEMBRO MAIS O NOME. VERMUTE CINZANO (lembrei)! A CERVEJA, HAVIA ENTRADO DISCRETAMENTE EM CENA E FAZIA UM TERCEIRO PAPEL. TALVEZ FOSSE APENAS UMA FIGURANTE SEM TALENTO. EU ERA ENTÃO UM GAROTO MAGRO E DESLUMBRADO. NÃO TINHA AINDA LIGAÇÃO COM O TEATRO OU COM QUALQUER OUTRA COISA. SÓ PENSAVA EM VIVER OS DIAS AZUIS NA PRAIA INCOMPARÁVEL E AS NOITES ENCANTADAS PELOS BARES DA MAIS SORRIDENTE BOEMIA. FRUIR A VIDA ENCONTRADA NO CONVÍVIO DOS AMIGOS ME TOMAVA TODO O TEMPO. EU ERA IMPIEDOSAMENTE FELIZ. SÓ AMAVA A EMBRIAGUES DAS DESCOBERTAS. O ÁLCOOL SÓ ME DARIA PRAZER BEM MAIS TARDE, QUANDO A CORAGEM DEU LUGAR AO MEDO. FUI UM JOVEM QUE BEBIA PESSOAS E SE EMBRIAGAVA DELAS. MUITOS DOS ANTIGOS COMPANHEIROS JÁ SE FORAM, LEVADOS PELA MORTE, INCLUSIVE AQUELE "EU" QUE JÁ NÃO EXISTE FAZ TEMPO. QUANDO PENSO EM MEU PASSADO, É COMO SE ESTIVESSE ASSISTINDO A UM BELO FILME, CHEIO DE EMOÇÕES, LÁGRIMAS E RISOS, MAS NÃO PARECE QUE AQUELE NA TELA SEJA EU. ASSISTO AO FILME E GOSTO, MAS ESTOU SOZINHO DENTRO DO CINEMA OU TALVEZ AQUELAS CADEIRAS ESTEJAM OCUPADAS POR PESSOAS INVISÍVEIS, PORQUE SINTO MUITAS PRESENÇAS A MEU LADO. SEMPRE FUI ASSIM: NÃO ME LEMBRO, MAS NÃO ESQUEÇO.
QUANDO ERA MENINO E NÃO CONSEGUIA DORMIR, EU IMAGINAVA QUE A CAMA ESTIVESSE BOIANDO EM ALTO MAR, COM OS TUBARÕES CIRCUNDANDO-A. DESTA FORMA, COM A SENSAÇÃO DO PERIGO IMINENTE, O SONO VINHA E EU DORMIA SERENO E EM PAZ. É ASSIM, ENTRE A FELICIDADE E O HORROR, QUE GOSTO DE VIVER ATÉ HOJE. A BEBIDA FORTE ME AJUDAVA NESTE MISTER. A CERVEJA, NO ENTANTO, COMO É A ÚNICA BEBIDA QUE NÃO LIBERTA O ESPÍRITO, FOI A ESCOLHIDA PARA O TEMPO DA MINHA VELHICE. SE NÃO FOSSE ELA, EU JÁ TERIA ME PRECIPITADO NOS ABISMOS SELVAGENS. ACHO QUE FOI POR ISSO QUE PASSEI A BEBER CERVEJA. FOI POR UMA VERGONHOSA PRECAUÇÃO. UMA REPULSIVA AUTO PRESERVAÇÃO. ELA É A MINHA REDE DE SEGURANÇA. NO FUNDO A CERVEJA É UM SINAL DE MINHA COVARDIA DIANTE DE MIM. ELA É UMA BEBIDA RELES, PESADA, IGNORANTE, QUE ME TRAZ PRESO À PEQUENAS CONVENIENCIAS SOCIAIS E VÔOS "POÉTICOS" APENAS MÉDIOS, QUANDO NÃO RASANTES. NA MINHA IDADE JÁ NÃO CONVÉM VOAR MUITO ALTO, POIS O MEU RADAR PARECE ESTAR LOUCO E ME PERDER É TUDO O QUE EU NÃO QUERO, EMBORA DESEJE.
PRONTO, AGORA JÁ SEI PORQUE BEBO CERVEJA. AINDA BEM QUE ELA NÃO CHEGOU MAIS CEDO, PERMITINDO COM A SUA AUSÊNCIA, QUE EU VIAJASSE PELA "VIA LACTEA", ACOMPANHADO DOS ANJOS QUE ME FORMARAM E QUE PERMANECEM EM MIM. SEM ELES NADA TERIA VALIDO A PENA E NEM FARIA SENTIDO. NISTO SOU MUITO GRATO À VIDA: ELA PÔS BASTANTE LUZ EM MEU CAMINHO.


CLÁUDIO GONZAGA.

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